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Dasein na Mídia: especialistas em carreira comentam a série brasileira 3%

Caminhando para a terceira temporada, a série brasileira “3%”, produzida e exibida pela Netflix, faz uma alusão aos processos seletivos e alta competitividade no mercado de trabalho. Apesar de ser uma ficção, muitas cenas se aproximam da realidade do dia a dia profissional. Para analisar a obra, a revista VOCÊ S/A convidou especialistas em carreira, entre eles nossa CEO Adriana Prates. Leia abaixo na íntegra.

PRESSÃO ALTA

A série brasileira 3% mostra jovens lutando por uma vaga que os levará para um mundo melhor – e pode ensinar muito sobre os processos seletivos das empresas

*Por Anna Carolina Rodrigues

O enredo da série brasileira 3%, disponível na Netflix, pode parecer bastante com a luta por urna recolocação durante a crise. A história mostra uma sociedade dividida em dois lados: o Continente (com escassez de água e comida) e o Maralto (tecnológico e rico). Quem nasce no local pobre tem uma chance de mudar de vida aos 20 anos de idade. Mas, para isso, precisa ser aprovado em um processo seletivo altamente competitivo, mas não tão justo. E apenas 3% serão escolhidos para viver no Maralto e nunca mais pisar no Continente. Exageros à parte, a série — inspirada nos clássicos “Admirável Mundo Novo”, de Aldous Huxley, e “1984”, de George Orwell — faz uma analogia com processos seletivos concorridos enfrentados pelos profissionais.

No caso dos jovens, o funil é até mais apertado que o da produção audiovisual. De acordo com um levantamento da Cia de Talentos, empresa de recrutamento voltada para esse público, do quase 1,3 milhão de jovens de 18 a 28 anos inscritos em 94 processos seletivos de 53 empresas ao longo de 2015, apenas 0,3% atendia aos requisitos exigidos pelas companhias. Para fazer um paralelo entre a ficção de 3% e a vida no mundo do trabalho, a VOCÊ S/A convidou especialistas em carreira para comentar algumas cenas do seriado. Atenção: contém spoilers!

CENA 1 – MERITOCRACIA PURA

O responsável pelo processo seletivo recepciona os milhares de candidatos e explica que apenas 3% serão escolhidos e poderão morar no Maralto. De maneira individualizada, pede que confiem no processo. “Você é o criador do seu próprio mérito. Aconteça o que acontecer, você merece”, diz Ezequiel.

NA VIDA REAL

“Não ter uma definição clara das regras que orientarão a seleção poderá gerar ansiedade e angústia – algo parecido com o que acontece em situações de trabalho em que os profissionais não sabem o que é esperado deles e seguem normas das quais muitas vezes discordam. Dizer que a pessoa “merece o resultado” personaliza os que é atingido negativo e desestabiliza emocionalmente quem não conquistou o objetivo.”- Ana Maria Rossi, presidente da International Stress Management Association no Brasil (ISMA-BR), de Porto Alegre

“A meritocracia só faz sentido quando avaliamos grupos que têm históricos de vida e estudos similares. Quando Ezequiel explica que só os melhores serão aprovados, o discurso mostra uma análise de competências, mas, na prática, a seleção ‘meritocrática’ acontece mais por afinidade do que por análise dos resultados de cada candidato. Os selecionadores costumam ter a tendência de valorizar características iguais à deles, aitude que pode prejudicar a diversidade.” – Patrícia Santos de Jesus, sócia-fundadora da Empregueafro, consultoria em diversidade étnico-racial e inclusão social.

CENA 2 – DESAFIO DA DIVERSIDADE

Os candidatos andam por uma rampa e Fernando, que é cadeirante, parece empacar um pouco. Outro candidato oferece ajuda, mas Fernando recusa. “Deixa eles verem que consigo chegar lá sozinho.”

NA VIDA REAL

“Quando uma pessoa com deficiência não aceita ajuda possivelmente é porque ela não precisa. Na cena fica evidente que Fernando quer mostrar sua capacidade. É comum alguém com deficiência preferir fazer sozinho o que com ajuda poderia fazer mais rápido, mas é importante ter consciência para entender os momentos da aceitação.” – Carolina Ignarra, sócia da Talento Incluir, que atua na inclusão de pessoas com deficiência na sociedade por meio do mercado de trabalho.

CENA – 3 SELEÇÃO FORTE

Um vidro separa os candidatos dos entrevistadores que questionam os motivos pelos quais eles acham que deveriam ser selecionados. Questionam sobre a família e usam estratégias agressivas – e que em muitos casos poderiam ser consideradas assédio moral – Para desestabilizá-los emocionalmente, como perguntar se um rapaz de uma família rica acha que merece ser tratado de maneira diferente, se um cadeirante se considera capaz de participar das atividades e há quanto tempo uma negra não lava o cabelo.

NA VIDA REAL

“A cena parece uma caricatura do que, há algum tempo, foi o processo de seleção. Algumas empresas tinham uma forma cáustica de observar até que ponto os candidatos aguentavam a pressão. Isso é mais raro hoje até porque seria interpretado como assédio moral. Os mecanismos atuais já protegem as pessoas de se submeterem a essa pressão.” – Eva Hirsch Pontes, coach executiva e professora convidada da Fundação Dom Cabral.

Adriana Prates, CEO da Dasein.

“Perguntas pouco convencionais são uma alternativa para fazer com que o candidato sinta-se mais à vontade. Mas jamais para desestabilizar. Isso acontece sob o argumento de checar como a pessoa age sob pressão. Apesar de ocorrer, trata-se de um absurdo. O candidato é um convidado e assim deve ser tratado. Não é preciso usar dessa perversão para conhecer alguém.” – Adriana Prates, presidente da Dasein Executive Search, consultoria de recrutamento de Belo Horizonte.

CENA 4 – STRESS TOTAL

Após a primeira etapa de eliminação, os aprovados caminham para seguir adiante e os eliminados vão em outra direção. “Pode até ser justo, mas é triste. né?”, diz uma das selecionadas. Segundos depois, um dos eliminados se atira do andar de cima e se esborracha no chão na frente dos aprovados. “Vocês não podem deixar isso afetar o momento mais importante da vida de vocês”, diz um funcionário.

“A pressão intensa ou duradoura tem efeitos dramáticos, principalmente nos profissionais frágeis emocionalmente, com baixa autoestima e sem recursos internos eficientes para lidar com o estresse. Interpretar metas não alcançadas como fracasso pessoal podem induzir a decisões drásticas. Entre elas o suicídio.” – Ana Maria Rossi

“Infelizmente isso é algo que ainda vejo acontecer nas empresas: tirar a emoção do convívio entre as pessoas. Mas nós somos movidos por emoções e não temos como deixá-las de lado. Hoje a gente sabe que a inteligência emocional tem um componente chamado empatia. E, aqui, o que eles estão fazendo é eliminar a empatia. A cena retrata um momento de desestímulo a inteligência emocional, uma das competências mais importantes para o sucesso das organizações.” – Eva Hirsch Pontes.

CENA 5 – COOPERAÇÃO E COMPETIÇÃO

Durante a dinâmica, os candidatos precisam usar diversas peças para montar nove cubos num tempo predeterminado. Fernando, cadeirante, não alcança as peças e outra candidata, Michele, o ajuda. Ao final do tempo, ela tem apenas oito cubos e Fernando empilha os cubos dela para formar um cubo grande. Ela, que seria eliminada, acaba sendo aprovada. Enquanto isso, outro candidato rouba o cubo de um concorrente e o avaliador elimina o que tinha completado a tarefa e aprova o que trapaceou.

NA VIDA REAL

“Quando há comentários de que ajudar pessoas com deficiência é uma atitude politicamente correta, entendo como uma ação discriminatória. Ajudar alguém é ajudar ao próximo, é viver em sociedade, que poderia ser mais produtiva se as pessoas se apoiassem. As empresas podem entender o que a pessoa com deficiência consegue fazer e, assim, valorizar suas potencialidades, pois as dificuldades geralmente são fáceis de ajustar ou pelo menos são ajustadas de forma pratica.”- Carolina Ignarra.

“Essa cena retrata algo que hoje é muito importante nas organizações: as alianças colaborativas, essenciais para que as empresas sobrevivam. As alianças são feitas por meio de trocas, parcerias e apoio ao outro em momentos difíceis – são uma forma eficaz de influência ética. Por outro lado, pequenas trapaças, infelizmente, também acontecem nas organizações. É interessante observar, contudo, que o próprio grupo passa a rejeitar, pelo menos temporariamente, o rapaz que trapaceou. Assim, sobreviver em um grupo em que você não tem um comportamento ético, no médio e no longo prazo, não se sustenta.” – Eva Hirsch Pontes.

CENA 6 – TRABALHO EM EQUIPE

Agora os candidatos precisam se ajudar. Eles são encaminhados a uma sala em que manequins sentados em uma mesa encenam determinada situação. O desafio é desvendar o que aconteceu com a mulher de azul, que tem uma expressão que esboça terror. Fernando cria uma teoria de que ela foi envenenada pela anfitriã com a qual todos concordam. Rafael diz que ela é alérgica a prata e está sufocando. Os raciocínios diferentes ajudam a chegar a um consenso e o grupo passa. Um dos participantes, que quebrou um vaso, é eliminado sob o argumento de não ter colaborado com o grupo.

“É importante que, em um bom trabalho em equipe, as respostas se construam com a colaboração de todos. O profissional que atrapalhou é eliminado. Infelizmente, muitas vezes, isso também acontece nas organizações.” – Eva Hirsch Pontes.

“O poder de persuasão de alguém, com frequência, tem mais impacto no grupo do que a lógica de um argumento. Um profissional pode se sentir frustrado ou até injustiçado ao notar que o colega que se comunica com mais eficiência conseguiu aprovar uma ideia não tão eficaz quanto julga que é a sua.” – Ana Maria Rossi.

CENA 7 – PRECONCEITO CONTRA AS DIFERENÇAS

Confinados em uma saia, os candidatos são instruídos a escolher qual deve ser o próximo eliminado. O critério? A equipe define. Rafael argumenta que Fernando não tem condições de passar no processo por ser cadeirante e que deve ser o eliminado, pois acha que o grupo pode ser prejudicado no futuro caso depare com uma prova física.

NA VIDA REAL

“A colocação do Rafael pode parecer absurda, mas é comum. Em agosto de 2016, lançamos uma pesquisa em parceria com o Vagas.com respondida por 4.319 profissionais com deficiência. Do total, 40% já passaram por situação de discriminação no trabalho e, destes, 57% tiveram atritos com colegas de trabalho. Os problemas são relacionados com falta de credibilidade em seu potencial, apelidos ou imitações ligadas às deficiências. O rótulo de incapacidade ainda é atrelado as pessoas com deficiência, por isso é necessário tratar o assunto com frequência, disseminando informações para os colaboradores e promovendo a convivência para quebrar paradigmas e construir novos modelos mentais.”– Carolina Ignarra.

 

*Texto originalmente publicado pela edição impressa da revista VOCÊ S/A

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