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Inspire-se com Laurindo Leal

“A mudança sustentável é aquela promovida por pessoas que cultivam e almejam a sabedoria”

Devoção à pesquisa, percepção apurada e lucidez são apenas algumas das características que derivam das palavras e posicionamentos do professor e atual diretor científico do Instituto de Tecnologia da Vale, Laurindo Leal, um dos mais brilhantes pesquisadores da engenharia de minas do Brasil. Leitor voraz, ele compartilhou conosco parte de sua história, além de referências intelectuais e humanas que foram essenciais para a construção de sua instigante visão de mundo. Inspire-se!

“Educação não transforma o mundo. Educação muda pessoas. Pessoas transformam o mundo”. A frase do célebre educador Paulo Freire ilustra a importância do conhecimento para a transformação da sociedade, das pessoas, das empresas. Com ampla vivência no meio acadêmico e também no mercado, de que maneira o senhor acredita que a educação pode mudar o cenário empresarial do país?

O grande Paulo Freire sintetiza uma receita muito clara para se aprimorar o mundo: educar as pessoas. Se educação se traduz em mudança de comportamento, certamente pessoas mais educadas serão melhores cidadãos e, no âmbito empresarial, empregados mais produtivos e engajados. Todavia, é importante ressaltar a ampla acepção da educação, endereçada ao aprimoramento do indivíduo como um todo, em contraponto ao mais restrito significado do termo instrução, associado ao progresso intelectual.

Numa sociedade tão tecnológica como a atual, a contínua formação intelectual das pessoas é imprescindível. Ao longo da história, vemos que os países que investiram maciçamente na instrução de sua população aceleraram seu desenvolvimento material. No âmbito das empresas, empregados tecnicamente preparados para exercer a sua função são potencialmente mais produtivos. Todavia, será que somente instrução basta? A resposta passa por uma profunda reflexão sobre os valores que pautam o nosso modus vivendi. Baseando-me em observações do mundo e do comportamento dos indivíduos (dentro e fora do meio corporativo), sempre concluo que é necessário que as pessoas sejam emocional e socialmente mais elaboradas. É necessário que as pessoas sejam melhores.

O exercício cotidiano do diálogo, empatia, tolerância, inclusão, respeito e justiça cria equipes mais coesas. Cortesia, cuidado genuíno e generosidade são ingredientes para a construção de um ambiente de trabalho mais feliz e, consequentemente, mais produtivo e criativo. Se considerarmos que passamos em média um terço do nosso dia no ambiente de trabalho, poderemos contribuir para o paraíso ou o inferno dos nossos colegas que, de certa forma, reverterá em maior ou menor felicidade para nós mesmos, além de facilitar ou atrapalhar as tão necessárias entregas que justificam a função do trabalhador. Educar, na mais ampla acepção da palavra, constitui o caminho para tornar as pessoas (cidadãos, empregados) melhores. Mundo melhor e empresas mais competitivas serão mera consequência.

Laurindo Leal é considerado um dos mais brilhantes pesquisadores da engenharia de minas do Brasil.

Estimular que os funcionários façam cursos como mestrado, doutorado e promovam no ambiente corporativo o debate de pensamentos pode ser um recurso para estimular a inovação e eficácia entre as pessoas? Por quê?

Para falarmos de mestrado e doutorado, temos que nos remeter ao seu significado: o mestre (do inglês master) [1] é aquele que domina plenamente um conteúdo já estabelecido, enquanto que o doutor (um indivíduo teoricamente douto), detém um conhecimento que transcende ao que está estabelecido, contribuindo para avançar o estado da arte de algum ramo do conhecimento. Posto isto, entendo que existe espaço nas empresas para mestres e doutores serem agentes de mudança e, quebrando paradigmas, fazerem a diferença.

Não obstante, conhecimento difere de sabedoria, que não se adquire somente com a instrução formal (curso técnico, graduação, mestrado ou doutorado). Sabedoria se adquire com a experiência e com a integração de múltiplos conhecimentos multifacetados e interligados. Consigo imaginar uma empresa progredir sob a influência de líderes sábios e inspiradores, mas temo pela organização dirigida por sabichões. Nas corporações, o processo de mudança requer pessoas corajosas. Coragem sem embasamento é atitude temerária de jogadores. A mudança sustentável é aquela promovida por pessoas que cultivam e almejam a sabedoria, mesmo que não estejam conscientes disto.

[1] Jack of all trades, but master of none.

Além de ser um grande nome da engenharia mineral, o senhor também é poeta. Como a arte pode influenciar pensamentos e melhorar o trabalho das pessoas? Por quê?

Sou apenas um tratador de minérios e, depois dos 50 anos, gestor de pessoas. Todavia, a trajetória do homem neste mundo não é um mar de rosas. Em maior ou menor escala, é uma mescla de desafios, desencontros e frustrações permeada de alegrias, encontros e conquistas. Nos últimos tempos, principalmente depois que voltei a residir em Minas Gerais (morei em São Paulo entre 1985 e 2013) a poesia começou a se manifestar no meu cotidiano e eu não sei como tudo começou. Só posso dizer que escrever tem sido um esforço despretensioso para retratar aspectos da vida que, de alguma forma mexem comigo, mesmo que escondidos entre os meandros de um cotidiano que nos chama mais à extroversão do que propriamente à reflexão. Deste modo, escrever poesia também é uma oportunidade para se autoconhecer. Outro ganho que me traz a poesia é a oportunidade de vivenciar catarses. Quanto à poesia melhorar o trabalho das pessoas, creio que a vivência em qualquer manifestação da arte contribui para sermos indivíduos melhores dentro ou fora do trabalho.

O senhor é referência para muitos profissionais. Gostaríamos de saber quais pessoas o inspiraram na construção de sua carreira?

Acho que tudo começa na família e meus pais foram meus maiores inspiradores. Sempre ouvi que o importante não é a profissão que se escolhe trilhar, mas a dedicação e retidão que se dá à sua condução. Depois da família, na formação básica, tive o privilégio de ter convivido com mestres maravilhosos como Norma Reiff Miranda, a quem devo o que sei de gramática e literatura; Maria Amélia Andrade Toscano Fortini, que me revelou os encantos da física; Padre Hervé L’Hénnaf pela matemática, Irmã Mirthes Braga pela religião e Dr. Messias Natalino Santiago pela filosofia. Na graduação em engenharia de minas, fui inspirado pelos professores Élcio Marques Coelho, João Martins da Silva e Sônia Margarida de Assis a fazer pesquisa científica em froth flotation e process mineralogy. Já como profissional júnior na Serrana S.A. de Mineração, tive o privilégio de ser subordinado a Ricardo Neves de Oliveira: visionário pé-no-chão, estudioso, organizado, exigente, íntegro e justo. Esta foi a base sobre a qual construí a minha carreira.

Ainda sobre suas referências, quais livros, filmes ou artistas ligados a outros gêneros culturais o influenciaram e foram marcantes em sua vida? Conte-nos o porquê dessas escolhas.

Muito difícil responder a essa pergunta sem ter a sensação de que deixei de mencionar alguma influência importante. Em cada fase da minha vida, diferentes manifestações artísticas particularmente me inspiraram. Na prosa, Alexandre Dumas, Jules Verne e Monteiro Lobato eram meus preferidos na infância, além da Enciclopédia Barsa, visto que era o jeito de conhecer o mundo naquela época. Nos anos 70 vieram Jorge Amado, Gabriel García Márques, Tolkien, Eça de Queirós, Machado de Assis, José de Alencar, George Orwell, Raquel de Queiroz, Graciliano Ramos. Já mais crescidinho, fui influenciado pelos dramaturgos Nelson Rodrigues, Ibsen e Tennessee Williams e na prosa de Herman Hesse, Dostoievski, Gorki, Henry Miller, Virginia Woolf, Hemingway. Já adulto pleno, vieram Jung, Joice, Proust, Goethe, Kafka, Clarice Lispector, Carl Sagan, Isaac Asimov. Hoje sou leitor compulsivo de livros escritos por historiadores sobre algum trecho da história universal. Há momentos em que me interesso particularmente por algum período da história e aí busco ler sobre tudo que aconteceu naquele período: música, escritores, pensadores, modismos, guerras, ciência e tecnologia, mocinhos e bandidos.

Quanto à poesia, o autor tem que tocar a minha sensibilidade logo de cara, sem nenhuma segunda chance. Outra limitação é a língua: poesia traduzida para o português é algo artificial para mim. Daí, não tenho uma lista tão grande de referências como na prosa. Meus poetas preferidos são Fernando Pessoa, seguido de Manuel Bandeira e Cecília Meireles. Mais recentemente, descobri García Lorca (afinal, o espanhol não é tão diferente do vernáculo) e Elizabeth Bishop, morando em Boston, querendo ter mais intimidade com o idioma inglês e sabendo que ela morou em Ouro Preto… mergulhei e gostei muito.

Quanto à música, meu gosto vai da erudita, canto lírico até o rock, passando pelo jazz, Piazzola, chorinhos e os inesquecíveis clássicos da música popular brasileira. Gosto de tudo o que é cinema: basta apagar a luz e mergulhar num mundo de sonho.

Compartilhe conosco uma frase ou pensamento sempre presente em sua memória.

Existe uma frase da Clarice Lispector [2] que nunca me saiu da cabeça depois que li pela primeira vez: “(…) basta me cumprir e então nada impedirá o meu caminho até a morte sem medo. De cada luta ou descanso me levantarei forte e belo como um cavalo novo”.

[2] Perto do Coração Selvagem.

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