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Por dentro da profissão: gestão de pessoas

“O RH precisa ser corajoso, tem que falar de coisas que ninguém fala”

 

Entrevista com Sandra Barquilha, diretora de Pessoas da 3M

Mais que vocação para inspirar pessoas a trabalharem por um objetivo comum, Sandra Barquilha tem disposição e coragem para arregaçar as mangas, assumir o protagonismo, e dizer o que precisa ser dito. Diretora de Pessoas e líder de Diversidade e Inclusão da 3M no Brasil, ela acredita na liderança pelo exemplo, na liberdade de falar o que se pensa e de ouvir, de abrir espaço para o outro. Diversidade, ela diz, é também sobre acolhimento, é sobre como reajo a quem pensa diferente de mim. Nesta entrevista, ela compartilha seu olhar sobre a gestão de pessoas e o que pensa sobre o futuro desta profissão.

Sandra olha para frente e sorri

Sandra Barquilha é diretora de Pessoas e líder de Diversidade e Inclusão da 3M no Brasil. Crédito: arquivo pessoal

Colaboração e inovação são qualidades muito desejadas pelas empresas (inclusive elas são atributos marcantes da cultura da 3M). Pensando no pós pandemia, com o modelo híbrido de trabalho ganhando força, como manter equipes colaborando e inovando mesmo sem a intensidade das trocas presenciais, com menos olho no olho?

Como no modelo híbrido as pessoas irão à empresa com certa regularidade, entendo que um caminho seja a otimização de seus espaços físicos visando a interação humana. Acredito na ressignificação desses espaços, inclusive, na ressignificação do trabalho no escritório. O RH vai ter que ser muito criativo e provocar o “encontro”, estimulando que uma reunião presencial, por exemplo, não trate apenas de temas de trabalho, mas seja também um momento voltado para as relações, para a conversa, para trocas sobre outros assuntos, sobre a vida, um momento de celebração.

É o que eu acredito que funcione, mas ainda não testamos o modelo híbrido na 3M e, sem dúvida, é algo que vai nos desafiar. Aprendemos muito nesses 18 meses de pandemia, porém o novo formato vai demandar uma transição, será outro tipo de desafio, vamos ter que reaprender.

Em relação à inovação, acredito que ela seja possível em ambientes psicologicamente saudáveis, onde as pessoas se sintam ouvidas, sintam que têm espaço para trazerem novas ideias. E as lideranças têm um papel fundamental nesse sentido, na própria forma de lidarem com o erro, na confiança que depositam em sua equipe. É muito sobre confiança.

A diversidade é uma pauta onipresente entre os profissionais de RH e grande parte das empresas já assumiu compromissos nesse sentido. No entanto, o número de mulheres em cargos de liderança caiu no país (segundo o IBGE, em 2018, as mulheres ocupavam 39,1% desses cargos e em 2019 passaram a ocupar 37,4%). Como o RH pode contribuir para que a diversidade não fique só no papel?

Precisamos continuar sendo vocais, falando, trazendo temas, discutindo, e não permitir que o assunto esfrie. Começa muito por aí. No Brasil, estamos longe de termos uma força de trabalho diversificada pensando nos grupos minoritários, é um desafio muito grande. Tem uma série de empresas trazendo estratégias diferenciadas, programas de mentoring, ações de desenvolvimento e aceleração de talentos. Você pode ter programas diferenciados de contratação voltados para a diversidade, isso vai ajudar na diversificação das pessoas, mas a nossa preocupação tem que ser com a inclusão. Já que incluir é muito mais amplo.

Na 3M conectamos inclusão a saúde mental, a um ambiente psicologicamente saudável. Quando falamos em diversidade, estamos indo além dos grupos minoritários. Estamos falando de um ambiente inclusivo, onde a pessoa tem liberdade para falar de suas crenças, de suas ideias. É muito mais sobre acolhimento ao que é diferente. É como eu, líder, reajo a uma opinião diferente da minha. Quando eu abraço a diversidade eu crio um ambiente muito mais rico do que aquele ambiente formado por pessoas que pensam como eu.

Falando em medidas práticas, sou partidária de duas bandeiras: do respeito e da informação. É necessário respeitar a diversidade em todas as suas dimensões e é preciso criarmos ações de informação, de conscientização de todas as pessoas, mas principalmente das lideranças, para que elas acolham a diversidade.

Ainda sobre diversidade (focando aqui em seu sentido mais amplo como as diferentes gerações), liderar pessoas com mentalidades e histórias de vida tão distintas não deve ser fácil. Como o RH pode estimular o melhor desses profissionais – o melhor dessas diferenças – e fazer com que elas agreguem ao negócio?

As lideranças precisam entender que a diferença vai ajudar, e não dar mais trabalho. Afinal, um bom líder é aquele que faz com que o resultado aconteça através do outro. E a produtividade só acontece quando as pessoas estão satisfeitas, quando elas se sentem incluídas.

Costumo dizer que falar de diversidade é exercício de empatia, mas é também um exercício de saber que para ser inclusivo eu também vou errar. As vezes vou ter uma opinião, vou aprender e vou falar que estava errada sobre essa opinião.

Já se sabe que todas as grandes invenções vem da quebra de paradigmas, vem dos questionamentos – “por que isso não pode ser feito de um jeito diferente?”. Isso só se dá se você tiver olhares diferentes. Um time em que as pessoas têm histórias de vida diferentes, visões de mundo diferente, tem um resultado melhor. Porque as pessoas vão ser naturalmente mais criativas. Cada geração tem uma visão de mundo e a soma dessas visões é muito melhor.

É importante saber, ainda, que é bom discordar. No entanto, por termos uma cabeça mais “emocional” não queremos discordar, talvez por confundir com desrespeito. Mas o conflito positivo é muito bom e não tem nada a ver com perder o respeito. Eu posso discordar de uma forma saudável, posso, por ventura, mudar minha opinião e está tudo bem. É importante sair do viés “eu tô certo e você está errado”.

O RH, que sempre trabalhou muito nos bastidores, ganhou os holofotes na pandemia e evidenciou temas essenciais como cuidar das pessoas, de sua saúde física e mental. Pensando no futuro, essa pauta continuará a ser prioridade para o RH? O que mais está no radar?

A humanização continuará a ser um tema muito presente, assim como os cuidados com a saúde, com o lado emocional. E vamos ter todos os desafios do mundo híbrido, o que vai gerar um grande impacto na atração, na retenção das pessoas. A diversidade, de forma concreta e real, também estará na pauta e será um grande desafio.

Acredito que o RH vai continuar nos holofotes se continuar brigando por esse espaço. Ninguém vai dar esse espaço pra gente se a gente não brigar por ele. E o RH precisa ser corajoso, tem que falar de coisas que ninguém fala, tem que “colocar o bode na sala”. É o RH que vai falar de saúde mental.

Você é uma inspiração para muitas pessoas, incluindo jovens mulheres que sonham em alcançar posições de liderança. Quais atitudes e habilidades foram essenciais na sua trajetória profissional? Você também se inspirou ou se inspira em alguém?

Poderia listar várias habilidades que foram necessárias ao longo da minha trajetória, mas destaco duas muito presentes na minha carreira e na minha vida (carrego sempre comigo um “Post It” com essas duas palavra rs) – protagonismo e a coragem.

Acredito muito que precisamos ser protagonistas de nossa carreira, e sei que isso não é fácil. É necessário saber escolher, ter atitudes. Sempre fui muito protagonista ao saber o que quero para mim e o que preciso buscar para chegar lá. E aqui eu to falando também de não delegar nossa carreira a ninguém. Nós que construímos, que corremos atrás, que fazemos o networking. Isso inclusive aumenta a chance de empregabilidade, pois você não deposita suas chances a terceiros (se o chefe ou a empresa não me promoverem etc). É trabalhoso, mas é algo que funciona.

Sempre abri portas tendo coragem de falar o que eu acredito, desafiando o status quo. Sendo uma mulher, isso foi ainda mais difícil. Por outro lado, ao atuar com RH, sempre tive facilidade de incentivar as pessoas a trabalhem por um objetivo. As pessoas vendo a coerência entre prática e discurso – por eu ser protagonista e ao ter coragem de falar o que ninguém falava, fui ganhando espaço com as equipes, com os gestores.

Também quero citar minha postura de eterna aprendiz – que tem a ver com protagonismo, com correr atrás. Tudo que sei de RH não vai servir nada pra esse mundo novo, acredito que vou ter que aprender e descobrir junto com as pessoas.

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