Nos meus devaneios posso até imaginar
A imagem singela de um novelo de lã
Desses assim que se via a cada manha
Nas mãos languidas e zelosas de uma senhora artesã
Nesse tempo, o senhor tempo era clemente
Não era assim tão pontual, nem mesmo tão presente, tão brutal
Não tinha a hora certa de chegar
Muito menos hora para acabar
Dessa vez eu estava ali
Como que recostada num divã
Com presença numa ligeira ausência
Já sentindo a eminência
Desse tempo com voz firme ao impostar
Que dali pra adiante estaria ele a tudo controlar
Nessa convergência inusitada
Do tempo, do novelo, do divã até mesmo acredito
Já passava da madrugada
Eu nem mesmo conseguia enxergar mais aquela estrada
Onde um dia eu deveria andar
Poderia até ter me sentido sem rumo
Ah… Sempre me aprumo
Às vezes o olhar pode até ser destemperado
Quase sempre é engraçado
Mas para ver é preciso se silenciar
Há que se mostrar com um quê alvissareiro
Ou até mesmo num imergir profundo
Será que sou mesmo desse mundo?
Se assim o for, quero a graça desse novelo
Mesmo que tenha como guia algum modelo
Que ao me fazer sentir, me refreie do pensar
Adriana Prates, 2017