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Dasein convida: Cris Pàz

Você se lembra do que gosta?

 

Domingos são provas de fogo pra mim. Ouço poucos ruídos, diferencio uns dos outros de um jeito que não acontece nos dias úteis. Domingo é dia de fazer algo especial, ou dia de não fazer absolutamente nada. E nesse mundo pautado pela produtividade, não fazer é ainda mais difícil do que fazer. Na calma e no silêncio, o domingo me pergunta quem sou eu e o que desejo de fato. E saber o que quero costuma ser das coisas mais difíceis. O domingo é um espelho, que mostra se estou bem comigo mesma, se estou feliz, se sou capaz de me dar bem com minha própria companhia e mais, se de fato sei o que quero e o que me dá prazer.

Acabo de sair de uma relação que durou cinco anos. Pouco depois do término, fui a Tiradentes com duas amigas. No quarto da pousada, um quadrinho trazia a frase: você se lembra do que gosta? A frase me pegou pelo colarinho, me deu uma gravata. Eu a trouxe comigo, foi minha primeira aquisição da nova vida de solteira. Não por acaso, uma vez por semana o silêncio do domingo nos faz essa pergunta. Que bom.

Cris Pàz é comunicadora, escritora, palestrante e produtora de conteúdo. Foto: Flávio Castro

Sim, eu me lembro de muitas coisas de que gosto, mas reconheço: muitas vezes me misturo ao outro e me perco de mim. Isso acontece na relação afetiva, pode acontecer na relação com os filhos e também com os pais – se você está na minha faixa etária, em torno dos 50, entende o que é fazer parte da geração sanduíche, essa que cuida dos pais e dos filhos, e corre o risco de não encontrar espaço para si. Meus pais se foram muito cedo, portanto não tenho que cuidar deles, mas ser mulher num mundo ainda muito machista nos coloca sempre em posição de atender às expectativas do outro, sejam elas afetivas, estéticas ou de produtividade – para dizer o mínimo.

Como minha vida nunca foi lá das mais tradicionais, acabei tendo que correr por fora. Estou em fase de me entender comigo mesma, antes de dar satisfação para o mundo. E nesse quesito tenho trabalhado direitinho. Venho de um período feliz, em que não tem me faltam afeto e carinho. Duas outras amigas têm sido minhas companhias para shows e outros programas culturais. Às vezes me sinto uma adolescente que não para em casa. Dia desses, durante um show do Chico Chico (o talentosíssimo filho de Cássia Eller) aqui em BH, me peguei pensando em quantos shows perdi, a quantos deixei de ir num tempo em que eu investia meu dinheiro mais em coisas do que em momentos. Mas eu estava ouvindo um cantor maravilhoso e curtindo muito, viva e feliz. Em lugar de me arrepender e me autoflagelar por isso, preferi pensar “que bom que estou aprendendo a curtir esses momentos”. Rapidamente agradeci pelas amigas que estão me impulsionando a não perder belos espetáculos.

Em lugar de olhar para o que não fiz ou para o que não sou mais capaz de fazer, é mais precioso voltar o meu olhar para como me tornei capaz de me conhecer melhor. Viver nunca foi fácil, mas se torna ainda mais difícil se não sei do que gosto e o que desejo, se não sei de mim. Em lugar de encarar a passagem do tempo como um momento em que já não faço tão bem o que fazia antes, ou como um despertador apitando para o que não posso mais, prefiro olhar para a maravilha que é saber viver tão melhor o agora. O que chamamos de envelhecimento pode ser finalmente o momento em que nos tornamos sêniores na vida, aquele em que ficamos craques em conjugar o verbo viver. Acho que estou ficando boa nisso.

E você, se lembra do que gosta?

Cris Pàz é comunicadora, escritora, palestrante e produtora de conteúdo. Tem oito livros publicados, assina colunas na rádio BandNews FM de Belo Horizonte, na revista Vida Simples, no site Dia de Beauté e ainda comanda o podcast 50 Crises (entre os Top Podcasts de 2020 pelo Spotify Brasil). Em suas palestras, aborda temas como saúde mental, luto, maternidade, protagonismo feminino, moda, gênero e gerações.

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