Status ou saúde mental: ressignificar o que é sucesso te leva a fazer escolhas mais conscientes
Seis da manhã, desperta o alarme. Banho ligeiro, acorda as crianças, prepara o café. Veste roupa, arruma mochila. Rápido, para não perder a hora. Trânsito para a escola, trânsito até chegar ao trabalho. Ufa! Bom dia a todos. Na agenda, reunião às 8h. Mãos à obra. Será que vou dar conta de tudo? Coração acelera, respira fundo. Aflição, insegurança.
Segundo a Organização Mundial da Saúde, essa é uma sensação cada vez mais recorrente entre os profissionais e tem crescido, demasiadamente, no Brasil: considerado o país mais ansioso do mundo. Dados divulgados neste ano pela OMS apontam que 26,8% dos brasileiros receberam diagnóstico médico de ansiedade.
As principais causas do problema, de acordo com a entidade, estão ligadas a índices elevados de desemprego, incertezas econômicas, preocupações com o futuro e ao uso excessivo de redes sociais. O que era para ser entretenimento e informação, tem se transformado em gatilho para comparações, idealização na vida pessoal e profissional e excesso de autocobrança – se não topar a corrida contra o tempo e der o meu melhor, não vou chegar lá.
Virou lugar comum abrir o Linkedin e sentir certa angústia ao se deparar com o bom desempenho dos colegas, principalmente aqueles cujo salário e prestígio podem bancar um estilo de vida perfeito. Para eles, o sucesso compensa as jornadas sem fim, mesmo que a saúde mental esteja capenga.
Se por um lado temos uma grande parcela de profissionais que valoriza a lógica do “tenho, logo existo” – sim, e eles são muitos -, por outro lado, vem crescendo o número de pessoas que compreendem sucesso como reconhecimento, qualidade de vida, ambiente organizacional saudável. Segundo estudo global da Gympass com 9 mil trabalhadores, 83% dos entrevistados afirmaram que bem-estar na empresa é tão essencial quanto o salário.
A definição de sucesso está em reconstrução?
No Brasil, o movimento está começando e tem ligação com as pautas ESG, principalmente no que se refere aos impactos do alto consumo na sociedade e meio ambiente. Mas como redefinir padrões sociais exige uma jornada de reflexões e desconstrução, é importante ampliar o entendimento do conceito de sucesso.
De modo geral, entre os brasileiros, ele é associado a poder (de compra, status etc) e também à necessidade de ser validado – é aí que a questão se aprofunda. De fato, como seres sociais, é natural querer pertencer, ser acolhido e aceito. O problema é quando a busca pela aprovação se transforma em pressão para se encaixar ou parecer bem-sucedido. Comportamento que tem gerado, segundo estudiosos, indivíduos que constantemente se comparam e têm dificuldade em definir as próprias escolhas.
“A comparação é a ladra da alegria”
A célebre frase, do ex-presidente americano Theodore Roosevelt, diz muito sobre uma sensação que acomete boa parte das pessoas que vivem se comparando às outras: a insuficiência. Diferente de se inspirar no outro como forma de se aperfeiçoar, a comparação tem uma conotação negativa e pouco prática, já que cada um tem a sua história, capacidade, talento e pontos de vista.
Se a trajetória de pessoas admiráveis for observada com atenção, é possível enxergar não só as conquistas, mas os diversos obstáculos. Compreender que a vida (até das pessoas mais notáveis) é cheia de altos e baixos te leva a se inspirar no percurso, mas abrindo mão da busca incessante de se igualar ao outro.
O que é sucesso para você?
Questionar, de forma aprofundada, aspectos internos (o que eu desejo?) e os externos (altos salários e prestígio definem uma pessoa?) é uma forma de encontrar caminhos. Em uma sociedade simplista e cheia de respostas prontas, muitas vezes nos baseamos na definição de sucesso do outro. Questionar muda tudo, nos faz saber quem somos e o que queremos.
É por meio do questionamento que colocamos em perspectiva os padrões, e fazemos um exercício sobre o que se encaixa em nossa vida, sobre o que faz sentido. É, também, uma forma de se conhecer melhor. E só o autoconhecimento nos permite fazer escolhas mais conscientes, reconhecer o nosso valor, o que nos motiva e nos conecta às outras pessoas.
Não se apegue ao que te falta
Quando temos plena consciência do nosso valor e do que podemos agregar, ficamos menos suscetíveis a julgamentos. Não desperdiçamos tanto tempo e energia em corrigir o que não nos agrada, aliás, será que não nos agrada ou não agrada o outro?
Investir nas nossas qualidades, no que temos de melhor, alimenta a autoconfiança. Nos coloca no controle e permite, inclusive, que incômodos sejam corrigidos de um jeito leve. Mais que isso: o sucesso do outro passa a não incomodar, pelo contrário, nos faz vibrar junto.